Dos graves do Trance às batidas do Electro House, dos beats de Rap aos teclados do Rock’n Roll, a música eletrônica se mostra flexível para qualquer estilo de produção musical. A versatilidade que os variados sintetizadores oferecem parece ser fruto de uma invenção de caráter moderno com uma infinidade de recursos. Mas história da música eletrônica nos mostra que a sintetização de notas musicais é muito mais antiga do que pensamos.
O Início
No século 19, a produção de sinais sonoros através de processos eletrostáticos já instigava muitos físicos e estudiosos, e impulsionava diversas pesquisas e estudos sobre a geração de som através de sinais elétricos. Apesar das limitações tecnológicas da época, em 1895 foi apresentado ao mundo o mais significante e pioneiro instrumento eletrônico capaz de sintetizar sinais sonoros: o lendário Telharmonium. A invenção de Thaddeus Cahill trabalhava com sinais eletromagnéticos impulsionados por teclados dispostos em um grande painel, de onde partiam os comandos para sintetizar e criar novos sons.
Apesar de inovador, o Telharmonium foi contestado por alguns físicos e recebeu processos legais alegando cópia de métodos e estudos aplicados no instrumento. Cahill, advogado experiente e físico reconhecido, além de não negar suas referências no campo da física mecânica, provou legalmente que sua invenção era autêntica e livre de plágios, obtendo sua patente em 1897.
A partir de então Thaddeus Cahill dedicou sua vida aos estudos da música eletrônica e suas contribuições mudaram significativamente os parâmetros da sintetização de sinais sonoros que emergia no início do século 21. Sua proposta era criar o ‘perfect instrument’ capaz de gerar e manipular mecanicamente conteúdos sonoros realistas em relação aos instrumentos tradicionais.
Cahill, apoiado nos estudos de físicos como Hermann Helmholtz (1821 – 1894) e Samuel Thomas (1755 – 1830) estudou as potencialidades da onda Sine para criar através de uma única frequência fundamental diversos conteúdos sonoros com tons e timbres que combinados poderiam recriar a qualidade sonora de instrumentos reais. Este método é amplamente usado em alguns tipos de síntese sonora, mas reservamos este assunto para outra matéria.
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A Evolução da Música Eletrônica Analógica
Após a invenção de Cahill, os estudos da música eletrônica se intensificaram com o passar da década, e não demorou muito para surgirem novas invenções carregadas de conceitos aprimorados e conhecimentos cada vez mais técnicos, como por exemplo a válvula eletrônica tríodo do Audion Piano, invenção de Lee De Forest criada em 1915. De Forest descobriu que a válvula tríodo, trabalhando com a técnica chamada heterodinâmica, podia gerar dois sinais de alta frequência imperceptíveis ao ouvido humano que quando combinados emitem um sinal de frequência menor e que alcança as frequências auditíveis, gerando assim ondas sonoras. Nascia então o primeiro oscilador capaz de gerar conteúdos sonoros através de impulsos eletrostáticos.
As contribuições de De Forest ultrapassam a esfera da música eletrônica, e muitos de seus estudos e conceitos foram usados para a evolução técnica do rádio durante as décadas seguintes.
Dentro da música eletrônica, os métodos descobertos e estudados por De Forest foram um grande salto para futuros instrumentos eletrônicos, cada vez mais aprimorados com os avanços de pesquisas da época.
Em 1930, Leon Termen criou um dos instrumentos eletrônicos que se tornaria o instrumento mais produzido e difundido até então: o Theremin. A invenção de Termen usava a mesma técnica heterodinâmica da válvula tríodo na geração de tons monofônicos, que eram controlados por um teclado de 61 teclas de cinco oitavas, combinadas com dois pedais que podiam moldar os sons com vibratos e características dos tradicionais órgãos e pianos. O Theremin Keyboard teve sua estreia em 1932 nos palcos da histórica casa de espetáculos Carnegie Hall, em Nova Iorque, durante o evento conhecido como ‘Theremin Electrical Symphony Orchestra’. Um grupo de dez músicos tocou alguns repertórios conhecidos da época, porém todos com instrumentos eletrônicos como o próprio Theremin Keyboard e o Theremin Celo, e ficaram conhecidos como “The Electro” ganhando espaço exclusivo em rádios nova-iorquinas como a Columbia Network, KMBC.
A esta altura do século a música eletrônica era bem difundida em boa parte dos Estados Unidos e no mundo, sendo cada vez mais conhecidos e estudados os métodos para sintetização do som. O maestro inglês e regente Leopold Stokowski, impressionado com as potencialidades sonoras dos instrumentos eletrônicos de Termen, começou a utilizar os Theremin Keyboards em concertos com sua orquestra pela Philadelphia, Washington e Nova Iorque, tornando a música eletrônica cada vez mais popular nos anos 30.
Nos anos seguintes, cada vez mais inventores se debruçavam sobre os estudos da sintetização sonora e criação de música eletrônica, e diversos instrumentos eletrônicos foram criados mediante os avanços de pesquisas de estudiosos, físicos e músicos pelo mundo todo.
A música eletrônica passou a ser produzida por diferentes métodos técnicos de sintetização do som e variados tipos de instrumentos eletrônicos, que se tornavam cada vez mais populares no cenário da música eletrônica, como por exemplo os órgãos e pianos eletrônicos desenvolvidos por Laurens Hammond em 1935. A Hammond Organ Harmony produziu diversos sintetizadores de música eletrônica por décadas, usando as mesmas técnicas usadas por Cahill em seu Telharmonium, porém de uma forma mais aprimorada melhorando a estabilidade das entonações e frequências produzidas pelos osciladores, contando com a evolução dos controladores modernos para modulação do som, além de possuir um design mais acessível diferente das invenções anteriores. A Hammond produziu instrumentos de música eletrônica que até os anos 70 ocupava lugar nas composições de diferentes estilos musicais como Jazz, Blues e Rock.
Até os anos 50 muitos instrumentos de música eletrônica foram criados e popularizados conforme o desenrolar das décadas. Instrumentos como o Ondioline do inventor Georges Jenny (França, 1940), o poderoso Sonde do físico e compositor Hugh Le Caine (Canadá, 1945), e o Electronium do inventor alemão René Seybold (Alemanha, 1950) são só alguns exemplos de instrumentos eletrônicos criados neste período, e mostra a grande difusão e patamar que a música eletrônica assumiu no cenário mundial.
O Mini-Moog
A música eletrônica se tornava cada vez mais popular à medida que novos instrumentos e sintetizadores sonoros surgiam no mercado. Mas alguns instrumentos esbarravam em um obstáculo que existia desde a criação da música eletrônica: a acessibilidade. Mesmo avançados tecnicamente, muitos instrumentos eletrônicos ainda demandavam muito espaço devido a sua aparelhagem, e muitos ainda eram reservados a pessoas com conhecimentos técnicos muitas vezes avançados e que não eram exclusivos do mundo da música, necessários para operar as individualidades que cada instrumento eletrônico exigia. Mas em 1960, graças ao nova-iorquino Robert Moog, este panorama estava prestes a mudar com o surgimento de uma nova geração na história da música eletrônica.
Aos dezenove anos Moog já estudava instrumentos eletrônicos e junto ao seu pai, engenheiro elétrico e fanático por música eletrônica, fundou a R.A.Moog Co, empresa que manufaturava kits do clássico instrumento Theremin e os vendia sob encomenda. A renda das vendas era convertida para os estudos de Robert, que estudou física no Queens College, em Nova Iorque, logo depois cursou engenharia elétrica na Universidade de Columbia, e por fim se tornou Ph.D em física pela Cornell University, em 1965.
Até então Robert Moog estudava a fundo as capacidades técnicas do Theremin, estudando diversos modos de criar e sintetizar música eletrônica com adaptações que evoluíram a invenção de Termen. Em 1963, trabalhando com o músico e compositor Hebert Deutsch, Robert Moog desenvolveu o instrumento que revolucionaria o mundo da música eletrônica: o sintetizador modular Mini-Moog.
Moog apresentou seu novo sintetizador em Manhattan, em setembro de 1964, impressionando músicos e estudiosos da música eletrônica no evento Audio Engineering Society Convention. Incorporando os conceitos e estudos do inventor alemão Harald Bode (1937) e do engenheiro americano Raymond Scott (1950), Moog desenvolveu um novo sintetizador com circuitos elétricos diferenciados com novos controladores de voltagem, que trabalham com 1 volt por oitava e que mais tarde se tornariam padrão para o controle e sincronização de sinais elétricos produzidos nos osciladores. O design dos sintetizadores de Moog era mais sofisticado, o que tornou o instrumento menor e mais acessível comercialmente, dando o primeiro passo na transição da velha-guarda da música eletrônica para a grande popularização dos sintetizadores.
A partir de então Robert Moog produziu e desenvolveu vários sintetizadores Mini-Moog, e transformou o cenário da música eletrônica no mundo. Muitos músicos começaram a incluir os sintetizadores de Moog em suas composições, como os Beatles, The Doors, Stevie Wonder, Kraftwerk e Wendy Carlos, musicista de música eletrônica que produziu o álbum “Switched on Bach” usando apenas os sintetizadores Mini-Moog, em 1968.
Os sintetizadores de Moog se tornaram a base para muitos instrumentos futuros, e estabeleceram padrões para a fabricação e desenvolvimento de novos instrumentos eletrônicos, produzidos por marcas como Yamaha, Roland e Arp. O nome de Robert Moog será lembrado para sempre na história da música eletrônica, e seu legado ecoará pela eternidade no mundo da música.
A história da música eletrônica não para por aqui. A versatilidade que a sintetização sonora atingiu até então ultrapassaria o universo dos recursos analógicos, se projetando para sintetizadores cada vez mais modernos que permitiram o início de uma nova fase música eletrônica, e você confere em A Era Digital da Música Eletrônica.
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