Ritmos de música caipira: tradicional ou comercial?

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Pra quem tem algum contato com viola caipira, já deu pra entender que esse instrumento tem seu universo à parte. Quando você vai aprender esse instrumento e alguém lhe explica que vamos usar a afinação “cebolão” (?) ou “rio abaixo” (???) a gente já começa a entender que tem caroço nesse angu. Nenhum outro instrumento, que eu saiba, tem nomes de afinações. E não só de afinações, mas de toques, estilos, nome das cordas, enfim, um vocabulário próprio que compõe os ritmos de música caipira

Nos estilos, que ainda podemos chamar de levadas, acontece bastante isso. Quando comecei a tocar fui aprendendo sobre o cururu, o cateretê, o pagode, a guarânia. E isso me chamou muita atenção. Curioso como sempre fui, decidi conhecer a origem de cada um desses nomes.

Como acontece com tudo quando a gente quer se aprofundar no mundo da viola, de repente me vi em um verdadeiro balaio de gato. É que existem ritmos de música caipira que tem tradição ou lastro na cultura popular, outros não.

Por exemplo, o cururu. No interior do Estado de São Paulo, em cidades como Botucatu, Piracicaba, Tietê e toda essa região existe um repente (cantado de improviso) que tem em sua história ótimos cantadores como Parafuso, Zico Moreira, Nhô Chico, Cido Garoto e muitos outros. Sérgio Santa Rosa escreveu um excelente livro sobre o assunto, chamado Prosa de Cantador.

Mas a levada do cururu que tem em seu repertório sucessos como Menino da Porteira (Teddy Vieira/Luizinho), Canoeiro (Zé Carreiro/Carreirinho), Pescador e Catireiro (Cacique/Pajé) e Rio de Lágrimas (Tião Carreiro/Piraci/Lourival dos Santos) não tem nada do repente e quase nada do ritmo do cururu descrito acima. Então o que seria exatamente cururu?

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A resposta pra mim veio ao analisar a indústria fonográfica. A partir do momento em que a música caipira adquiriu o formato do disco, se rendeu a essa lógica. Tudo o que existe na indústria precisa de um “rótulo” para que o público identifique o que está comprando, e no caso de um bem cultural o público consumidor precisa se sentir integrado nesse “produto” que consome.

Não é estar integrado como quem nasceu e vive mergulhado nessas tradições, pois isso é distante para a maioria do público consumidor de determinada música. Mas um formato comercial torna essa música mais próxima da maioria do público.

A música caipira tem seu início na indústria através do pioneirismo de um personagem fundamental, um paulista de Tietê chamado Cornélio Pires. Não vou me estender sobre Cornélio nesse texto pra não mudar o foco, ele merece (e terá) uma publicação nesse blog só pra contar sua história.

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Mas para o interesse do presente assunto, basta dizer que Cornélio Pires inaugurou a música caipira no disco e inaugurou a música independente no Brasil, pois ele bancou do próprio bolso, contraindo uma dívida vultuosa, a primeira série de discos gravados com esse gênero, abrindo um filão de enorme sucesso na indústria do disco. Isso em um distante ano de 1929, quando ocorreu a quebra da bolsa de Nova Iorque.

Uma das consequências desse processo inaugurado por Cornélio Pires foi a criação de uma enorme quantidade de nomes de ritmos que muitas vezes foram criados só pra servir de rótulos, mas que não encontram nenhuma origem histórica.

Algumas vezes as duplas criavam esses nomes só pra serem exclusivos no gênero, como Cacique e Pajé – os reis da chibata, ou Tião Carreiro e Pardinho – os reis do Pagode.

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Entender os ritmos de música caipira, como se vê, não é para iniciantes. Eu passei um bom tempo tentando por esses pingos nos “is” quando a mesma coisa parecia ter vários nomes. Mas isso não tira o encanto dessa história pujante da viola, pelo contrário, só a torna mais rica. Então, por hoje é isso pessoal, até uma próxima publicação!

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